28 julho 2008

O Cão e o Dono


Supõe meu dono, ao conduzir-me pela rua,
que apenas sua é a vontade que comanda.
Se eu ando, anda; paro, pára; avanço, avança.
E nessa dança prosseguimos ano a ano.

Qualquer fulano, entretanto, sabiamente,
vendo a corrente que nos liga o tempo todo
e o tenso modo que nos marca o caminhar,
há-de indagar: mas, a final, e a liberdade ?

Onde a vontade de viver, independente
dessa corrente que vos ata e vos limita
e delimita o vosso espaço e a vossa vida ?

Nessa sofrida convivência que nos pune,
o que nos une eu desconheço, isso não nego.
Sei sermos cegos, prisioneiros cão e dono.

25 julho 2008

23 julho 2008

Vale a pena ler de novo (V)




Leilão dos Bens de Abadia

“Começa às 14h desta quinta-feira o encerramento do leilão de uma lancha e de quase 70 relógios e canetas de luxo que pertenciam ao traficante colombiano Juan Carlos Abadia”.

( Dos jornais )

Pra quem tem supertição,
quarqué coisa faiz sentido.
Arguém faiz sinar da cruiz,
quano cruza com ingreja;
otro vira logo o pão,
pra que a mãe não tenha morte.
Por ridículo que seja,
o impurso é munto forte:
mermo sendo de um bandido,
uma cueca traiz a sorte.

A. Cerviño – SP

(Migalhas, 15.04.08)

21 julho 2008

Freiras & feiras


Para o Francimar, com estima

Numa quarta-feira, uma freira foi à feira, encontrar uma segunda freira, que vinha de uma quinta com uma cesta.

16 julho 2008

Il Arco Íridis

(À maneira do Juó Bananére)

Io tava no chópingue co’a Mafalda. Tudas as veisi qui o negrelo passava per noi, la mia moglia sucurava a borsa forte di incontro aos peito. I adonde nóis ia lá stava o negrelo com qüeli dui ogli negri in gopa di nui. Io nun gustava di qüelo e arresorvi domandá a uno signore, di terno azulo, sempre parlando nuno teléfono senza filo. Doveva éssere uno sicuranza. Io tchercava uno dgeto di acalmá a Mafada, mia moglia. Qüelo negrelo lá é uno suspeto. Ilo istá persegüendo noi. Io desidéro qui ilo cheja investigato, io falê ansin cum inleganza pro sicuranza, como si fossi uno filme amerigano.


U uomi mi ogliô da testa al piede i mi proguntô: Per acaso lui sape qui il preconceto di colore é crímine inafiaçábile in qüesto paese?


Má qui é preconceto? Io non hó preconceto nessuno. Compro il pane na padaraia di uno portugueise isquifozo, sensa ricordare tuto qui il Salazaro há fato nei ani 40/50, dopo di lachare il Mussolino xupano u dedo; compro mei escarpe na logia do Isaco, sensa ricordare tuto qui la parentela dilo fizero c’o nostro Jesú Cristo, qui ilo non aceta come figlio di Dio, qüelo disgraciato.


Il signore há chiamato qüelo citadino di negrelo i qüesto la nostra lege non amitte. Guarda, le dico io, guarda bene una cosa. Il Dio in cui il Isaco non crede, há criato tute le cose del mondo. Há criato il sabiá larangiera, le rose, il papagalo. Si ilo há criato tute le cose come ilas sono, é perquê ilo quiria qui ilas fosse como sano. Bene? Si io dico qui um piriguito, qüelo papagalo anô, per ricordare uno timi di cálcio qui io adimirê molto in ani passati, ma qui oggi non mereci una spernáquia, é azulo, qui qui il signore, con tuto respeto, mi dice? Dice qui io sono patso. Il piriquito é verde, verde come la foglia de tute le árvole qui il traficante di monho dirúbano nela Amazônia i qui il governo findge qui non vede. Azulo é il mare, cuano l’áqua no stá poluta con tuta qüela fece qui il pópulo dispegia nei canali aquátice e i prefeti non facen niente.


Vá via, qui io non tengo tempo per conversa fiata, dice Il signore.


Conversa fiata! Perquê fiata, si io me stô buscando li isplicá qui non sono criminale come il signore pensa qui io sono? Io falava dei colore de tute le cose criate da Jesú Cristo i qui il Isaco supone qui nascero di chocadera. Ma, io domando, qui há inventato la chocadera, qüela prima, madre de tute le madre? Fu Dio. Ilo é la chocadera qui cria, ilo medésimo, tute le chocadere.


Saímo du chópingue i entramo nel ônibo, sempre guardando si o negrelo non venia co noi. Cuano il ônibo já stava bê londgi, a Mafalda dá um bruto duno tapa nela testa.

Bastiô! Era o Bastiô. Io pensê qui o inchidente aveva laxado mia moglie patsa. Ila mixplicô. Nun ti ricorda da Dgenoveva, qüela negrona qui mi fazia la faxina, cuano io istava na guarantena? Il figlio dela era uno negrelo molto tímido, bambino cosi pícolo. I oqui sono i medésimi. Io me ricordo bene dei qüeli oqui. Per qüesto qui ilo non venia parlare co noi nel chópingue. Era di vergonza!


Vergonza! La mia vergonza ancora era piú grande qui qüela del negrelo. Ma, Dio, perquê tu non há fato tuta la genti de la medésima colore? Si il arco íridis qui é il arco íridis no tché la colore negra, perquê tu há fato dgente de tali colore?

Mentratanto, Mafalda, co la sapienza delhi moglie vivite, m’augmentato la mia vergonza: Ma dove tu há visto la colore bianca nel arco íridis, cecato?

14 julho 2008

Vale a pena ler de novo (IV)

Bronca

Tem juiz puto da vida
com o Migaias, dotô!
Foi notiça difundida,
já digo o que se passô.
Foro eles para a praia,
todos de sunga e sandaia,
dizeno assim: “não espaia,
foi os banco que pagô!”.

A. Cerviño - SP



É pro A. Cerviño, de Sampa:

Esse versinho é nortista!
Essa língua é dos meus mano,
num pode ser da Paulista
cum seu céu de arioplano!
É cordel arcoverdense,
de Aderaldo, cearense,
ou Preá, pernambucano.

Zé Preá

(Migalhas, 15.09.2006)

11 julho 2008

Sínteses (V)

Languidescência - palavra nobre pra eu não sentir vergonha desta preguiça imensa

09 julho 2008

O Que mais Conta



Não a rosa, mas o gesto
Não o tapa - a indiferença
Não a mão, senão apoio
Não o beijo, mas o afeto

Não a nau, mas a viagem
Não o sol, porém a luz
Não o teto, mas o abrigo
Não a vida, mas o amor

Não a lua, mas a calma
Não o tempo, mas o instante
Não o abraço, mas a estima
Não a morte - a eternidade

02 julho 2008